sábado, 14 de dezembro de 2013

De-deixa.

A deixa aqui é a seguinte...
Vira e mexe tem vontade de dizer o que não se diz sobre as coisas que as músicas dizem.
Deixa...
Sentir 'de lá de dentro a vontade'.
Se não servir pra mais nada (como se o mundo e todas as coisas que nele se encontram ou nele são encontradas servissem para ter função, servissem pra algo que não fosse tão somente o nada) serve pra dançar mergulhada e deliciosamente (que nem quando a danceteria tá lotada e você nem liga ou quando está entregue adolescentemente no quarto sozinha).
Tem músicas que a gente não sabe se são geniais por conta do clima e da atmosfera que conseguem criar, se pela letra, ou pelo tom de breguice (que é aquela coisa que quase todo mundo na espécie humana burguesa sente, mas tem vergonha de admitir) ou se por outra coisa que você não consegue e nem precisa explicar.

É essa uma dessas, genial em todos e nestes sentidos. E sobretudo no título.
Deixa!




sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

Do elo crespo como mola propulsora


14 horas da sexta-feira treze: a missão.
Eu confesso. Hoje tá difícil. Um sono insistente e sou quase um espectro. Aumenta minha capacidade de cometer pasteleiras (termo definidor de minha potencialidade de distração).
Precisando estudar e me sinto desenergizada. Mas vamo lá!

Fiz um café. Na verdade assim, pus água pra ferver. Enquanto rolava a ebulição fiquei na interneta capturando notícias e textos que me interessam. Costumo fazer isso no tempo pré-estudos-pós-almoço que é quando sei que, se começar imediatamente a ler, durmo.
É a hora enrola-sono até que ele desista e resolva passar pra que eu possa continuar a ter vida própria.

A água ficou borbulhante lá na cozinha. E eu, em frente do computador.
Daí vi isso:



Acordei na hora!
No segundo seguinte lembrei de uma música (ah, que novidade!).
Depois da brisa, eletrocutada, pus a música pra tocar e voltei pra cozinha. Passei o café com a conexão dos cachos a todo vapor e com as palavras escorregando nas voltas crespas da cabeça.
Com a xícara quase balde estimulante voltei pra frente do meu mal necessário e, as pontas dos dedos movimentaram a energia acionada no corpo-cosmos e dai: não pensei nisso.
Foi também um bom momento para olhar pros meus dedos decorados de vermelho-alaranjado pela Cris hoje cedo, outra negra linda do cabelo lindo! É mais bonito quando os dedos carregam as palavras com as pontas cheias de verniz. Quem disse que a estética do palavreado não é importante?

Como a missão da sexta feira treze continua, deixo a música de bandeja que relampeou na minha cuca quando vi o vídeo. O café acompanha pois 'meu processo apesar de lento pode fluir'.
E por fim eis me aqui, firme na parceria e na linguagem da meta.
E esse é um texto em primeira pessoa. Ostento agora madeixas mais curtas, porém mais armadas.







domingo, 8 de dezembro de 2013

Quem me dera


Quem a conhece ou desconhece sabe que ela sonha textualmente em linguagem musical. Conhece ou desconhece pois não se pode tomar a parte pelo todo sem articulá-las e menos ainda negar a necessidade de conhecer desconhecendo, de acertar errando, de enlouquecer lucidamente.

É assim que ela pensa muitas vezes. É assim que ela cosmo-visa o mundo. Não só assim, mas bem assim.

Há momentos em que a linguagem é a meta e não a metalinguagem. Este é o caso.
Momento do contraditório, pois se a linguagem quer ser meta de chegada bem que pode ser ponto de partida.

Meti aqui um exemplo do contraditório e da sua afirmação. Poético e político que é pra ser sincera. Pra ser parte. Para estar contida no mergulho que entorpece e emancipa.

Isto é esse post. A contradição como meta paradoxal e o paradoxo como meta. Aquele que quer alcançar todos o lugares e ampliar os sentidos ao mesmo tempo em que não tem a pretensão de chegar a lugar algum. Ou ainda "o além dos além" que nunca ninguém viu como assim falou Estamira.


Assim, hoje a música não é de bandeja e o texto é que vem de brinde. É comum no exercício antropológico e na vivência pessoal-cultural que brindemos nossos mortos. De toda forma, o texto musicado e o texto escrito estão juntos e conectados nela e por ela. Daí a meta dela e da linguagem. E a linguagem da meta dela.

Sobre o brinde aos nossos mortos e mais além, por Boff:
http://leonardoboff.wordpress.com/2013/12/07/o-significado-de-mandela-para-o-futuro-ameacado-da-humanidade/


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A mágica da dádiva é que ela não pára na tua mão. Ela segue em infinitas parcerias.
A meta é tornar infinitas as possibilidades de comunicação e cognição para a liberdade dos seres. E quem dera fazer algum sentido entre os elos da corrente que re-une o humano em sua humanidade.

'Quem me dera não sentir mais medo algum'. 



domingo, 17 de novembro de 2013

segunda-feira, 11 de novembro de 2013

3 pontos 5 noves fora.

Escrever é como parir.
Não é uma coisa assim que você vai lá e faz. Assim sem menos e sem mais.
Tá certo que tem uma hora interna que você sabe que tá tudo lá, ainda que sem pé e nem cabeça. Daí você imprime, faz um ultrassom.
Por isso acaba-sendo-parto. Você sente, sabe, vê que está lá o teu rebento mas quando arrebenta você precisa olhar pra cara dele pra saber se tá tudo bem.
Se a cara tá naquele lugar que a gente acha que é o lugar normativo da cara.
O pé tá no lugar que nosso entendimento limitado enxerga que era pra onde estar o pé.
O gênero adequado pra cor da roupinha que escolheu pra ingressar na civilização fashion. Ou não (tomara!)
Mas já que o rebento ou arrebenta é seu, ou sua, tem que ter a tua cara, digo, tem que ter algo de você ali. É a sua reprodução.
Mas arrebentado o rebento ou arrebenta, uma vez que é ou quer ser produto - não no sentido produtivo e também nele - não pode ser só reprodução. Tem que ter tido criatividade e sintomas como ânsia de ansiedade mesmo ou de vômito para casos mais dificultosos. Dor também. E paixão. Alguma. Ou o que a gente chama de apego, amor.

Parou de escrever. Na verdade tinha escrito. Mas tava naquele pé: sem cabeça.
Aquele que apareceu pra escrever o parecer falou umas coisas. Ele tinha bem razão. Ou ela. Entendeu tudo e disse que o texto tinha que se fazer entender. Foi um bom parecerista o aparecista que de maneira invisível, prescreveu o receituário.
Mas então. Ela fez o recomendado na bula, ou melhor, na prescrição. Só que daí aniversariou.
Ela chegou. A mãe.
Depois quem chegou foi o presente que ela tinha se dado. O inanimado-animado Bandeira do outro post.
Ela não teve tempo pra ele, ainda. O famigerado, como diria o Rosa.

Só quis o tempo pra ela.
Veio de longe e trouxe e cantou bolo de parabéns. Re e encontrou seus amigos.
Trocou confidências e confianças com ela.
Pariu também. Cada um pare o filho que tem.
Hoje ela disse:
- Vou-me. Vai cuidar das suas coisas! Eu fico aqui e empato você.
Empata nada. Ela me ganha. Diz assim que é um jeito que mãe tem de dizer pro filho que você fica o tempo todo dando atenção pra ela e não sabe mais o que fazer, porque deixou tudo o que tinha pra fazer na vida só pra fazer isso: ficar com ela.
E hoje descabeladamente arrebenta acordou e deu de cara com a mala dela pronta e perto da porta da rua. Roupa trocada, esperando ela voltar do útero do sonho:
- Já tá pronta? Ensalivou sonâmbula.
E assim ela rumou pra metrópole. Foi. Deixou a rebenta arrebentada. Tem nem 12 horas e já tá que é toda saudade e costume.

Até na missa foi. Na verdade não foi na e nem à. Foi ao comércio. Mas daí, é como na piada: a porta tava aberta.
Tava pela metade, a porta não: a missa. Ainda bem, pensou aquela que entrou não por que a porta deixava, mas porque desde criança faz até o que não lhe agrada para agradar a mãe.
Mandou mensagem SMS:

- Tô na igreja, acredita?
Responderam: - Que bom.

É, mal não faz.
Então. Nada demais. Ritos que sabe de cor antes da antropologia. Sentiu-se no banco de madeira do catecismo infanto-juvenil e depois do reforço das leituras universitárias sobre catolicismo popular e ainda nos trabalhos de campo na cultura popular devocional. As músicas manjadas, todo o rito na memória. Então comunhão nenhuma lhe tira do sério.
Rendeu-se.
A mãe falou:
- Quer ir buscar o carro, ir ao banco: eu fico aqui. Disfarçando que é dessas que agrada a filha também, na retribuição de quem sabe que está sendo agradada.
Puta que pariu, pensou: como ela me conhece! E diz: Não, eu fico. Estava rendida e feliz na submissão. Mas não esperava um golpe tão baixo prescrito no final do rito.

Todo católico sabe. Ou quem já foi, enfim... Depois de todo o rito de comunhão e da paz de Cristo que é aquela hora da paquera ou de abraçar um amigo querido ou a sua mãe e sempre apertar a mão de um desconhecido (aqui também pode mudar o gênero, número e grau), tem uma hora informal que é aquela que antecede a libertação do catecúmeno materializada por essas poderosas palavras:
-"Vamos em paz e o Senhor os acompanhe" ou algo do tipo ou em outra língua, mas que você entende que acabou tudo.
Enfim, antes dessa hora tem os avisos à comunidade. Política tem também, a depender. Ou ainda falas sobre acontecimentos triviais (ou extraordinários) da comunidade. É que cada lugar é um, cada caso um caso. Em termos conceituais: todo rito por mais manjado tem as suas singularidades.
Eis que o padre teve a audácia de repetir, em forma de ladainha, a pergunta semanal da paróquia. Quer dizer, teve a capacidade infame de tornar singular algo mais que batido:

- Quem fez aniversário essa semana?

Acabou a antropologia ai. Ao menos a dela. Precisava urgentemente de um antropólogo ao lado pra fazer o registro da reação dela. Enrubesceu: de um jeito que ninguém poderia ver se tiver imaginação de quem acha que só gente pálida enrubesce. Parecia que tinham lhe dito no meio do templo e para ela mesma e ainda por cima, para todos: seu nome completo, idade, comida favorita, detalhes da sexualidade, quando deixou de fazer xixi na cama, enfim ficha completa.

A mãe falou: - Vai lá, Elisângela.

Toda vez que alguém me chama assim por extenso e que não é minha mãe fica parecendo que é. Só ela tem essa entonação para 'Elisângela' como algo solene ou para me mandar fazer algo do tipo "obedeça". Parece até que tá acontecendo grande coisa quando ela fala assim.
A rendição tem seu preço, mas não é porque está catequética e colonizada que não vai reagir. Não é porque é filha e por que quer agradar que não vai reagir.
E esse 'vai lá Elisângela' foi fulminante. Ela, quase ríspida que era pra não deixar debate:

- Não, não vou não.

Estava rendida na submissão, mas até rendição é escolha. Você precisa deixar explícito o limite e os termos da rendição. Se for retribuição, melhor. Você se sente pagando o justo.
Então, cantou parabéns junto e para os dois alvos lá no altar, mas também para ela mesma e pra outra escorpiana que ouviu o mesmo 'vai lá Fulana' do companheiro e teve o bom senso de dizer que não ia.
E terminado o parabéns adaptado à situação cristã, o abraço que ganhou da mãe foi qualquer coisa que não tem vocabulário agora pra dizer.
Chorou. Duas lágrimas, talvez três.
Aquele abraço foi todo abraço do mundo. Eu, Narcisa envolta na Terra, minha mãe. No templo. E só.
O mundo acabou.

Quando nasceu de novo disse:
- Só você pra conseguir me fazer entrar aqui.

E aos trinta e cinco, aprendeu que aprende mais de si e dela, enquanto o tempo dos sessenta dela, também passa.



quinta-feira, 31 de outubro de 2013

Dia do Saci ou Ralouim. That is the question?



DIA DO SACI OU RALOUIM?

that is the question?


E passo a citar Roy Wagner (2012) d' A Invenção da Cultura (pp. 37-38 da Edição Tupiniquim e de bolso da Cosac & Naify):

Essa palavra é cultura.
Quando eles falam como se houvesse apenas uma cultura, como em "cultura humana", isso se refere muito amplamente ao fenômeno do homem; por outro lado, quando falam sobre "uma cultura" ou sobre "as culturas da África", a referência é a tradições geográficas e históricas específicas, casos especiais do fenômeno do homem. Assim, a cultura se tornou uma maneira de falar sobre o homem e sobre casos particulares do homem, quando visto sob uma determinada perspectiva. É claro que a palavra "cultura" também tem outras conotações e importantes ambiguidades.

 A questão é o grifo?
Não. O grifo é a questão.


"Poderíamos retificar isso um pouco e dizer que um antropólogo é alguém que usa a palavra 'cultura' com esperança ou mesmo com fé' ( Roy Wagner)




Semana que vem, ela aniversaria.
E inventou que vai doar a si mesma um Manuel Bandeira cronista do Brasil provinciano pra Marcel Mauss nenhum botar defeito no presente.
Porque a Antropologia é a pedra no meio do caminho. E a Antropofagia nos une.
Mas no mesmo sistema circulatório entre veias-cabeça e coração antropológicos inventar o cotidiano, seu e do próximo, também se faz necessário.


Os meninos-sacis e não-sacis foram inescrupulosamente arrancados do google imagens. Mas, antes, já tinham sido retirados do livro que os retirou do cotidiano para os por na história.


sábado, 19 de outubro de 2013

Diuturnamente


Enquanto ela caminha no aparato móvel dos trilhos,
enquanto ela flutua diante da encruzilhada que a vida impõe,
o operariado opera o milagre diuturno da transformação do extremo leste em Corinthians.
E aos poucos a paisagem vai se tornando menos Itaquera.
Ao mesmo tempo em que o Brás é obstruído no horário de pico.



Bônus track:http://www.youtube.com/watch?v=w8YbTJfR_9o&hd=1

sábado, 12 de outubro de 2013

Pueril-cultura

Feliz dia das crianças!
Com um abraço daquela que vos escreve.


um pouco de 12 de outubro

Quando eu tinha dois anos luz, queria ler e não sabia. Mas isso não me impedia de escrever histórias próprias

Hoje também é o dia da santa negra.
Música de bandeja: http://www.youtube.com/watch?v=2oKWTz-VPYE






sábado, 31 de agosto de 2013

Raiou o sol de Naná

Esse texto nasceu durante uma experiência músico-gestual-visual-sonora não-passiva.
Passiva é essa coisa onde tem um palco, alguém distante que se apresenta e um público leigo e/ou especializado sentado, calado, quieto.
Aquilo ali era uma imersão. Ainda que se ficasse sentado, calado e quieto. E também por isso mesmo.
Ainda que se cumprisse a disposição e o ordenamento das cadeiras e da instituição.
Se disser que era um show, tá errado.
Já foi ao Recife?
Já foi à Floresta Amazônica?
Ao Recife já. "Nagô, Recife nagô".
À Floresta, Naná me levou. Eu tinha uma garrafa d'água pra matar a sede e um xale para cobrir os ombros da friagem. À Floresta em plena civilização dos Serviços do Comércio. Em plena convivência interna. Em horário nobre. Em sexta noturna.
Aquilo era teletransporte.
- "Eu quero ver dois cantador embolando. Eu quero ver dois cantador embolar".
E pôs todo mundo pra jograr entre Garimpos e Ginásios.
- "Eu quero ver é sol raiar".
Raiou em lua mansa de Araraquara. Que as palavras evocadas tem poder transformador. 
Foi "na batida do tambor e no chiado do ganzá" com "orquestra quase afinada":
- "Ah, bum!"
Porque eram "as vozes de Araraquara que estavam ali" entre Garimpos e ginásios poliesportivos.
E conversou.
- "Em todo lugar que eu vou, eu vou dando os meus gritos".
- "Eu sou um Brasil que o Brasil, de certa forma, não conhece".
- Traduzir ou contrapor sons da natureza é uma experiência a ser vivenciada. O som da chuva, da floresta nossos tímpanos não alcançam o som do Rio Amazonas. Não vou por isso num cd, não tem cabimento.
E ela pensava na dimensão ritual que uma apresentação como aquela, tinha. 
Porque embora ele admitisse que sua dimensão humana era um limite para ser natureza, o som e o uso que faz do corpo contradiz toda limitação que admite.
Pois ele é um mensageiro. O mensageiro não vem só pra ensinar. Vem também pra confundir.
E ela continuava pensando e vivendo o ritual interno e externo.
E eis que surgem na tela elementos e signos bem presentes no catolicismo popular do Brasil. Que agora lincavam com os signos negros e indígenas antes expressos.
E eis que entre os sons da natureza, há sons de povos, sons étnicos, sons de lugares. 
Aquilo era uma paisagem sonora. Naná empresta o corpo e por meio dele estabelece comunicação.
Naná era o cavalo do terreiro. Aquilo era teletransporte.
E aquilo era admitir que, de certa forma, ser o Brasil que o Brasil desconhece é atestar a grande influência que as práticas culturais populares e as formas rituais de grupos negros e indígenas de diversas etnias têm na produção musical brasileira como um todo.
O artista de grande projeção na música do mundo é o mensageiro, o criador e a criatura.
Faz mediações e estabelece comunicações emitindo sons e realizando gestos que conectam elementos naturais (água, vento), elementos da natureza (a mulher, o homem e os outros animais) e práticas culturais de grupos e povos diversos.
Não basta se conectar a internet pra fazer isso. Não basta ter microfones fazendo eco. Antes precisa de conexão com o cosmos e abertura para viver o estranhamento. Abertura para viver a experiência com o outro. Pra sentir.
Depois, ele lembra a nega do cabelo duro, a moda e o pente que a penteia. E como se tudo tivesse cabimento faz um som de rave com aquilo que ela visualizou, com o perdão dos percussionistas, como sendo quatro caxixis gigantes.
- "Vento, êo".

Quem não tem papel escreve no guardanapo. Que ela também tem mensagem pra transmitir. E quando baixa o santo, baixa ali em qualquer lugar.
- "O candomblé ainda é o que faz o negro se juntar. O samba é canção de guerra não foi feito só pra brincar".
Agora é no verso, que o primeiro plano da árvore transformada acabou:
- "Atraca atraca que vem Nanã êê. Atraca atraca que vem Nanã, êa".
E falou de vida.
E falou de morte que nem ele e nem ninguém aqui vai ficar pra semente.  
Nem na Araraquara e nem em nenhum lugar.
Tem que estar conectado ao cosmos pra saber. Mas se não estiver, basta estar vivo.
Embora sempre se seja semente e semeador. Que ser mensageiro é semear.
E depois de provocar estranhamento e fascínio como condutor de uma excursão rumo ao desconhecido, deixou as pessoas todas imersas num mar de sons e palmas "daqui pra lá" e "de lá pra cá", entregues às suas próprias vozes. E mesmo sem ver e sem pensar, ficaram todas elas não-passivas e conectadas por meio do som e dos corpos. E para provar que a música cânone é muitas vezes, fruto do popular. E isso quer dizer que a música só é cânone porque comunica. Encontra ressonância no coletivo e não porque o artista é um ser do além, intocável e distante da ralé.
Ao contrário.
Porque mensageiro vem que é pra transmitir.
E unir.
Faz é tempo que esse moço tá fazendo isso.



Dobrou cuidadosamente o guardanapo.
Quando saiu do transe, viu uma amiga que não via há tempos. Ela fica por alguns meses em Araraquara onde o sol de Naná raiou e mais outros entre sons, águas e sóis de Xingu.
E foi-se.
Em outro espaço sideral viu outra amiga que a imaginou durante a imersão: - "A Li vai pirar".
E pirou. Que não existe criação e criatura sem alguma loucura.

  
  



sábado, 24 de agosto de 2013

Ensaios de Antropologia capilar


Tem gente que vende xampu. Eu não vendo nada. Mas hoje acordei com uma pilha de neurônios histéricos interessados por temas falados, mas nunca antes publicados.
Ondas sonoras, pensativas e sistemáticas escorregaram pelos cachos sedas-ceramidas não, mas manteiga de karitê também não. O fato é que com hidratação ou sem ela, conexões elétricas e motoras agiram e me puseram em ação em sábado matutino.
Neurônios histéricos precisam ser contemplados. Não querem saber se é sábado, se foi feriado municipal ou qual foi a fala da Dona Odete Roitman.
Hoje eu acordei e liguei o processador de informações que também funciona como vitrola acoplada. Por que a caravana não pára.
E escrevi na primeira pessoa.
Porque era arrumação de tese que o setembro chega na forma de 2013 primaveras. E na forma de uma saraivada de prazos.
Mais antropologia capilar e menos propaganda de xampu.


E chega de alisar palavrinhas e palavrões que hoje eu tô curta e grossa. Porque quem me conhece sabe que se eu fosse a presidente da banca defenderia que os salões de embelezamento só deviam conquistar esse título se abolissem a chapinha e privilegiassem a manicure.
Por causa dos neurônios bem-dispostos hoje ainda não penteei o cabelo. Mas em compensação, eles me deram a trilha sonora.

domingo, 4 de agosto de 2013

Antepasto de Berinjela (ou Cada Um Luta com as Armas que Tem - ou Expropria

Há quem pense que dizer o que sente não tem nada que ver com política.
Engana-se.
Todo bom antropólogo sabe (ou devia saber) que o sucesso de seu trabalho de campo está diretamente relacionado às falas que obtém. Mas há ainda algo mais. Há aquilo que não pode ser gravado ou vir a público.
O segredo é a alma subterrânea da pesquisa de campo.
Quando você não diz o que sente sonega uma informação elementar daquilo que você é, foi ou pode vir a ser. Acaba sendo um ser de integridade parcial. Mas a parcela que falta é a que você deve pra você mesmo. Que no final a gente não deve nada pra ninguém. Alguém que não diz o que sente pode ser por que não consegue identificar o sentido, pra si mesmo. Como é que vai ser para o outro? Difícil. Mas pode ser também que o sentido fique incubado, guardado no si mesmo, sem arrebentação.
Porque ninguém vai ficar parado no tempo e no espaço sendo uma única-exclusiva-coisa só.
Sem conseguir ser o outro ou detê-lo nas armadilhas da ciência, o grau de aproximação do pesquisador daquilo que a pessoa é ou quer ser vincula-se à sua capacidade de ouvir e guardar segredos.
A cumplicidade entre pesquisador e 'pesquisado' que se sujeita por livre e espontânea pressão-vontade para além das falas e ações publicadas resulta ainda no que não pode ser dito. Tal intimidade pode ser comparada aos silêncios de pacto de sangue entre gangues ou entre casais e pessoas em suas trocas mais secretas. O que funciona como uma espécie de Filosofia na Alcova.
Pensava nisso enquanto esfaqueava dois lindos exemplares de Solanum melongena tornando-os filetes. Estivera a sonhar com elas encharcadas de azeite e desfalecidas pelo calor de um forno assante. Elas, submetidas a essas condições juntadas a uvas passas resulta das combinações mais inusitadas e mais interessantes ao paladar. Era com isso que sonhava a dias. Toda essa transformação culinária, o Cru e o Cozido, o Doce e o Amargo ali, na sua frente para o almoço de domingo.
Costuma realizar seus sonhos. Sobretudo com aquilo que come.
Gastou nele um vidro de azeite. Português do mercado porque o produto do tráfico virou presente materno. Esse tráfego-tráfico tem que se intensificar mais, sem as mediações do clero, da burguesia, das empresas de viação aérea, da receita federal e da Igreja. Precisa de azeite português sem mediações, como se atravessar o oceano fosse atravessar a rua. Não se trata de um sonho de consumo, apenas. É no mínimo limitado, condenar assim alguém que apenas pensa no tráfico do azeite quando a história mostra que o tráfico era de escravos. E 'Formação de Quadrilha' devia ser o nome que se dá aqueles que insistem em impedir que o fiel toque, beije e converse com seu próprio santo. As restrições perderam lugar na Era do Vinagre foi isso que o Papa de batinas esqueceu de dizer.
Depois que parou com o tráfego-tráfico esbarrou com a rotina do teatro que interrompeu em Hygiene a última peça que faltava da Teatrologia do XIX e que foi buscar em Coimbra.
Pois bem.
Primeiro ficou imersa numa Dama do Mar internacional de Municipal que se combinou ao anfíbio ao qual se fundiu no cinco do mês. Adaptada ao título, mas desconfortável porque a gente nem sempre tem que saber o que fazer. Aliás, quase sempre não sabe. Aprende na marra como todo ser vivo. E cria, transforma como faz o bicho-homem/mulher.
Depois foi ver outra mulher, Cacilda!!!Glória no TBC de um Zé Celso vigoroso filho da Araraquara que lhe cospe ao mesmo tempo em que aplaude. Hoje, domingo, tem mais na Morada Ensolarada. Dentre todas as combinações alto-baixo, céu-inferno, sagrado-profano do sempre-mutável na mitologia do diretor, cinco horas em  que os 1960 se encontram com 2013 ao som de Evoés coletivos com direito a Minotauro. Tudo dispersado por lances de bomba de gás lacrimogêneo como num cataclismo atômico e tecnológico, mas que também atua como Maracatu.
Quem quiser que veja e reveja. E faça seu próprio trabalho de campo, a sua imersão.
Vai sair de lá com muitas mulheres, uma lição sobre o fazer teatral e tapa na cara de histórias de luta no Brasil.
Mas, por favor, não me perguntem: 'o que é que Antropologia tem a ver com Teatro*' ou o que isso tem a ver com aquilo. Pessoalmente, recuso respostas fechadas. Mas como boa professora que quero ser, abro para questões dissertativas, indico que se retome o primeiro parágrafo ou que se leia a bibliografia citada ou discretamente sugerida. Tudo isso sem esquecer do toque especial, juntar os ingredientes com a percepção do universo ao redor -  no plano interno e externo.
Amém. Saravá. Só a Antropofagia nos une, nos salva. Diria o Oswald. 'O Salve' fica por minha conta. Por conta dos crentes na força dos temperos.

* Para Ana Carolina, mulher, amiga, filha, irmã, tia e atriz.
Tudo não necessariamente numa ou noutra (des)ordem.

terça-feira, 30 de julho de 2013

Decifra-te.

Se tivesse de ser um animal alado seria uma coruja.
Certamente.
Não exclusivamente.
Apenas do clã dos alados.
Pois bicho é também marítimo, terrestre.
Se tivesse que ser aérea, seria uma coruja cameleônica. Dessas que quando a gente pisca, já mudou de cabeça mas os olhos continuam lá, misteriosos, a te devorar.
Decifra-te. E aproveite para utilizar a conjunção "-me", a seguir. Ou seria partícula?
Uma dessas encorujadas que a gente encontra no meio da estrada quando todos os carros já desistiram de passar.
Sonâmbulas. Dessas que já estão ali, faz tempo, a te olhar intensa e profundamente. Das que velam enquanto tudo é silêncio e todos já desligaram as luzes.
Não, nunca foi das mais carnívoras. Mas devem existir aquelas que se perdem em rúculas azeitadas e alfaces calmantes e soníferas. Porque o mundo não é homogêneo nem nos universos encorujados. Não, nunca foi das mais sangrentas carnes. E tem sido cada vez menos. E os desafios da existência estão aí, a se oferecer todos os dias, clamando por superação.
E dai?
Daí que todo trickster pode ser o que quiser e ao mesmo tempo. Então, se tivesse que ser, seria observadora astuta que come carnes cruas sangrentas, além de ratos peregrinantes. Ao mesmo tempo em que devora com amor rúculas frescas e alfaces desprovidas de vinagre.
E mesmo tendo uma cabeça giratória, empenho da mais alta tecnologia da natureza, não teria tempo para se preocupar com questões filosóficas e humanas. Seria apenas mais um ser vivente, inserido na cadeia alimentar, lutando pela sobrevivência. Seguindo seus instintos e voando para onde der: na telha, nos muros ou nas encostas.
Mas enquanto não chega esse dia, escolheu transmutar-se em tia colhedora de frutas suculentas para dar ao sobrinho curioso que leva tudo que tem nas mãos à boca.
E trocou a luta predatória pela sobrevivência por delírios que a sacodem da cama para palavrear madrugada adentro. E ainda se delicia com o abrir de janelas para que o ar de brisa-de-noite-que-acabou-de-ser, adentre a casa junto com o sol das manhãs.
Mas depois volta a sonhar do ponto em que parou.


Que é pra não perder o rumo da história.


segunda-feira, 15 de julho de 2013

Depois que vi o infinito

Fogueiras são forças hipnotizantes.
Esteve às voltas, noites dessas.
Esse vento visível e desidratante é todo junino e julino no seu interior, mas antes era todo ancestral.
Fogo é coisa de sonhador...
Elemento revolucionário!
Depois virou indústria.
As coisas todas se retorcendo, desprovidas de sua água, vão desvivendo até encinzentarem num empoeiramento. Se for papel, queima de um jeito. Mas, se for madeira, que é um jeito diferente de ser papel, difere a desfiguração.
Muitas são as coisas que podem ser vistas diante de uma fogueira. Inclusive a cegueira.
Quando se cansa, pode-se olhar para o céu. Estrelado. As estrelas são luzes distantes que teimam em ficar perto naquele sempre inalcançável. Um estado vivo enquanto morto. As estrelas demoram-se a morrer.
Chorava ao ver o fogo estralante, em tons de azul, de vermelho-laranja, vermelho-sangue. Amarelo até. Mentira: era lilás.
Força tanta que era, poder transmutado num amarelo cósmico lacrimejante.
Dois olhos enfaiscados inundaram brasas refrescantes que escorreram em erupções constantes, ainda que controladas.
Fogo tem som só que também silencia quando quer. Seu som é vibrante e escaldante. Já teve ouvidos para ouvir? Soa como estrelas que fogem quando a água escorrega delas, queimante.
E pode até ter cheiro, se for um arroubo de flor. Se tiveres coragem de ver o sol sob as folhas secas... não aquele sol vivo de brisa que envivece. Falo daquele sol timbrante que esturrica toda a clorofila esparramada na folhagem, aquele que destitui toda a beleza primaveril em cinzas carbonizadas. Um sol de mamona rachada. Sabes? Esse! O sol-fogueira que destrói toda a vida da flor, mas em troca a transforma em perfume solto no ar. Cinza perfumante que dá vontade de suspirar.
E de morrer de ensuspiramento numa intoxicação.
Depois que ele queimar tudo, vem o mar guardado nas nuvens e faz a terra cheirar na ponta do nariz-gotícula. Mas também se pode ver o fogo-fumaça-de-asfalto porque, eu disse, depois tudo virou indústria. É só olhar ao redor depois que a gente esquece das estrelas.
Quando todo um ciclo, toda a morte refeita, a vida vira vento colorido bailante e água que arde na pele e no peito. A viagem é pra dentro, infinita. E quando você chega dela tens um cheiro de defumação colado no corpo. Não podes ter imunidade ao infinito porque nele estás.
Oito é infinito, já viu? A Matemática foi quem levantou.


Depois que voltou do infinito sonhou com alguém que trabalhava muito. E tinha um plano.
Sabes?

quinta-feira, 11 de julho de 2013

Da preguiça

Ela sabia de tudo o que tinha preguiça.
Então o título veio logo, acabado de sair do banho.
Da preguiça é diferente de dá preguiça, sabemos.
O quê um acento bem assentado não torna diferente a vida da pessoa e as palavras da vida.
O dia era nacional e ela sentia preguiça.
É muito comum, mais do que ela podia controlar e ter consciência, esse seu sentimento de preguiça.
Muito ativa. Altiva. Muito ativa nos últimos meses.
Preguiça.
Era julho e depois de tanto exercício produtivo tinha medo de ter preguiça.
Mas tinha.
Quando era criança vivia ouvindo a mãe a mandá-la pro banho. Tinha mais coragem para brincar. A mãe não perdeu a mania de mandar, porque ela não perdeu a preguiça e nem deixou de ser filha. A diferença agora é que a preguiça é de sair do banho. A mãe não diz "Por acaso sou a dona da Sabesp?" em substituição a "Por acaso seu pai é dono da Sabesp?". O pai morreu sem ser dono de nada a não ser de si próprio e a mãe não incomoda o banho dela por nada.
Fundou, as pessoas todas fundam isso de certo modo, certos termos que explicam situações em contextos íntimos. Termos que antes remetem ao contexto em que foram forjados e explicam-no servindo também ao contexto atual em que foi acionado. Mas esses termos as vezes, extrapolam a intimidade e pulam da boca em contextos públicos ampliados.
Preguiça era um deles.
Costumava dizer tenho preguiça de gente que não responde mensagens.
Tenho preguiça de fazer média só pra não bancar a antipática.
Tenho preguiça de sair.
Tenho preguiça de ficar.
Tenho preguiça de escrever e de ler também.
Preguiça é então um ás, palavra preguiçosa e autoritária que não deixa soar outras palavras. Limita a criatividade ao mesmo tempo em que é altamente criadora.
Mas riu com os pensamentos rompidos pelo amigo que também tem preguiça de um monte de coisas, inclusive do lugar onde trabalha. Riu. Ele, que é muito desprovido de preconceitos musicais, cantou Débora Blando em tema de novela global enquanto abria janelas, e disse que nem ele que esteve a oferecer cartões de crédito o dia inteiro estava tão mal-humorado quanto ela. Quer dizer, com tanta preguiça. Ela riu. Nem se tivesse preguiça, teria o riso contido. Havia conteúdo risível naquilo tudo, no seu mal-humor que não era preguiça, mas fome.
Antes, quando se deparou com a preguiça faminta e mal-humorada dela, o amigo que é irmão compreendeu e cantou "se alguma coisa perturba você..."

E ela triplicou o riso. Lembrou de alguém que também deve sentir preguiça de várias coisas. Inclusive de gente que não tem medo.
Ela tem medo também, só que o transformou em outro nome.
Ousadia.

https://www.youtube.com/watch?v=9oYuBcTBQCM



quarta-feira, 10 de julho de 2013

M.M.A

Adriana tem lindas composições.
Dias desses andei ouvindo a Adriana entoando sua própria canção.
Mas a música era da Mart'nália.
Só que eu já era apaixonada pela canção da Adriana, que era da Mart'nália, entoada pela Marisa.
Nocaute é nocaute, não se finge. O amor é dessas coisas que depois de entregue não adianta reivindicar de volta.
Ou adianta?
Vai saber...

http://www.youtube.com/watch?v=Xp4SGYnqv8k




segunda-feira, 8 de julho de 2013

Just in time


O título chegou e depois era feriado.
Bebeu bebeu. O sapo que tinha na garganta saiu. Uma náusea grande, um parto.
Expectativas superadas. Fruto viçoso colhido num contentamento contido.
Dançou dançou. E flutuou no efeito terapêutico, extasiante-calmante.
Ficou muda depois. A voz saiu, o sapo levou embora. Silêncio.
Agora adentra madrugadas escritas em meio a goles de chá de gengibre. Não é por que não tem voz que não vai falar.
E abandonou-se aos romances visíveis em filmes cúmplices que só os amigos, daquelas entregas absurdas e inquestionáveis veem juntos. De tão boas, essas entregas a destituem de si mesma, ao mesmo tempo em que se entregam todos. Nem sempre os vê, esses amigos. Os encontros são a retomada do que sempre é. Mas a troca, categoria antropológica por excelência, não é do mercado. O mercado rouba. A troca é humana. 
Tem amigos humanos. Dos que a fazem ver romances. Mas dos bons, ainda que sejam romances.
Tem amigos arcaicos. Daqueles que intensificam tudo na vida. Estão imersos na necessidade de viver.
Era pra ser um texto sobre romances. Ela quase sempre foge deles e por isso os vê tardiamente. Procura ser apaixonada em tese. E exatamente por isso (o que não quer dizer que seja isso) disfarça, fala de teses, de filmes. E só depois, quando pode é que fala dos romances. Emudece quando não sabe o que fazer com o que sente.
Na prática sabe que a paixão não está restrita aos amigos. 

E foi dormir.


http://www.youtube.com/watch?v=CgXUeRbel3c

segunda-feira, 1 de julho de 2013

Deixa o verão pra mais tarde

Podem dizer que gostam mais da versão do Hermano-Amarante.
Eu não.
Taí um caso onde a releitura é melhor do que a versão de quem compôs.
As vezes, e pra cada estação, é questão de ritmo...
O verão, aqui, ficou pra mais tarde.
...

https://soundcloud.com/balynah/mariana-aydar-deixa-o-ver-o

domingo, 30 de junho de 2013

Sociologia dos transportes públicos

Os paulistanos* acabam de fundar uma nova categoria sociológica.
Eixo rente à sociologia de boteco, eis que os últimos acontecimentos fundaram a sociologia dos transportes.
Pode ser um evento pontual, mas o fato é que se ouve à boca pequena, média e grande. A análise sensocomunal diz que não são só os vinte centavos, embora também o sejam. O descontentamento é grande, "em todos os setores" diziam. Um mais velho, quarenta, aproximadamente. O outro, nem trinta. Mas perto deles.
"Educação falida".
"Pensar, realizar um raciocínio lógico: não há estímulo para isto".
"Se o estudo escolar está reduzido ao decorar, só se faz reproduzir sem crítica aquilo que é repassado". "Um povo com sabedoria e saúde é pedra no sapato deles".
"Só não investem em saúde e educação porque são investimentos que trazem resultados a longo prazo. Não é o governo que está no poder que vai usufruir imediatamente, com votos. Mas sim o outro governante que entrar no lugar dele".

E ainda tem gente que diz que o senso comum não está suficientemente politizado. Até parece que só os acadêmicos têm leitura própria da realidade que os cercam.
De todo modo, acadêmic@s ou não, podem dizer: eu presto mesmo muita atenção nos homens.

* ou quaisquer moradores das grandes cidades do país e que passam sufoco nos transportes públicos.

sábado, 29 de junho de 2013

Cada um tem a marcha que precisa

Tem descompasso.
Tem gente que marcha por educação.
Tem gente que marcha por saúde.
Tem gente que marcha sem terra.
Tem gente que marcha por direitos.
Tem gente que marcha por conquistas.
Tem gente que marcha-soldado e vai preso pro quartel.
Tem gente que não tem nem vinte centavos de marcha.
Tem gente que ataca quem marcha.
Tem gente que ataca quem ataca.
E tem gente que marcha para Jesus.

sexta-feira, 28 de junho de 2013

O título vem depois

Andou viajando, na vida, ultimamente.
Viajando na vida andava sempre. Mesmo que estivesse parada. A cabeça sempre foi de menina que não parou em lugar algum. Imaginação é o primeiro instrumento que tinha para ser livre.
Mas andou viajando pra além do imaginário. Este anda com ela pra onde ela for, ainda que fique quieta.  E sobretudo por isso. Mas andou a viajar diria, mais precisamente.
Nesse viajamento, houve momentos em que ela achou que a viagem estava acabada quando apenas tinha acontecido uma pausa. Dessas que também podem ser musicais.
Quando a viagem retomou a si própria, ela disse que não tinha nada a ver com aquilo. Mas sempre soube, ainda que se enganasse sobre o fim da viagem - porque tem uma intuição muito intuitiva, essa menina - que era só o começo. Pois então...
Isso tem a ver com o momento da vida. Não tem casa estabelecida. Um dia está na casa da mãe e do irmão. Outro dia na casa das amigas lá do outro lado do oceano. Outro dia na casa da outra amiga em São Paulo, no outro dia na casa do amigo-irmão e d@s vári@s amig@s que fez no sertão da pauliceia quando fez uma pausa de treze compassos. Enfim. Trânsito. Desses que colocam os carros um atrás do outro nas ruas, mas também do outro, aquele que faz com que você não consiga desfazer a mala. É isso, pousos de libélula.
Demorou pra entender o que era isso. Era tudo e não era nada. Ficou treze anos parada em um lugar, que era novo, antes. Depois ficou velho. O lugar, tudo. Ela inclusive. Treze compassos, dez dezenas e três unidades contidas em dois milênios ocidentais. Acostumou-se com aquela felicidade e com as tristezas guardadas no tempo-espaço do mesmo compasso. Precisava ser triste e feliz em outro lugar, soltar outras notas, cantar em outras afinações, ver filmes com intervalos e criar novos filmes na memória. E ela, que vê como sua a responsabilidade de inventar a própria vida, inventou outros lugares na cabeça e fora dela. E os lugares também inventaram-na que ninguém é imune a nada.
Mas este não é um escrevinhar sobre movimentos da vida, que ela ainda não sabe pra onde vai, mas tem ido. Era continuar a dizer sobre papéis. Ia dizer que era um escrever sobre papéis, de novo. Mas olhou pras linhas de trás e viu que era isso e mais outras coisas. Os compassos. Os movimentos. 
Toda vez que viaja compra papéis: pros amigos mais amados. Oferece coisas ridículas, árvores rasgáveis. Um dia, se lhe odiarem, rasgar-lhe-ão todos os presentes. Quando percebeu que comprava muitos papéis de presente pra si própria e para @s querid@s, passou a comprar lápis. O que será que isso quer dizer? Ou não quer dizer? Ou quer dizer e não diz? Ou diz e não quer dizer?
Lembrou-se de um tipo de papel comprado recentemente para si. Alice através do espelho. Abandonou a viagem da Alice na outra margem do rio oceano, tinha de prosseguir (n)a sua própria viagem.
Quando a viagem já tinha assentado nela, assentou num banco de passageiro para o retorno. Como num acaso interessado, deparou-se com um filme que há muito queria ver. 
Achou que, como as músicas que tem na vitrola da cabeça, aquele era um filme que encerrava bem aquela etapa da viagem. Um filme pode ser bom por si mesmo, mas as vezes não é por isso: é porque você esteve envolvido nele. Esteve no filme, com ele. Esse filme, desse caso, é composto por coisas tão absurdas, quanto os absurdos que ela tinha na cabeça e na memória. Enquanto via, dizia que não era possível, chegava a ser altamente contestável.  Era um clichê aquilo, porque enquanto o via, pensava e não conseguia esquecer que estava diante de um filme. Contestava o filme. Dizia que não tinha nada com aquilo, como não tinha nada a ver com a viagem. O trailer não mostra nada - acho que é daqueles trailers que não consegue dizer o que o filme é. Assim como o caminho da viagem. Tantos caminhos cabem nele que se faltar um, não se pode dizer o que a viagem é. O trailer e o caminho não mostram nada, mas devem mostrar alguma coisa. 



No fim, a viagem é sempre pra dentro.


quinta-feira, 27 de junho de 2013

Dias de Clélia

Precisava só de cola.
Dessas que colam papéis. Adora papéis com acento. Não consegue pensar em papeis. Mas essa nova gramática serve para imaginá-los em branco. Acentuados são, necessariamente: escritos, desenhados, numerados, rasurados, cheios, usados, amassados, rasgados até. É que nem aquela coisa de Geo-grafia: sem ação humana devia ser espaço expressado, escrivinhado ou imaginado diferente daquelas vezes em que o bicho-homem pôs as patinhas.
Era disso que precisava, uma pasta colante. Achou a papelaria.
A Lapa de São Paulo não é a mesma do Rio, mas bem que podia ser...
Bom, não era. O balconista, um senhor, bem senhor, mas bem simpático. Ela disse que precisava de cola. Dessas de colar papéis. Em seguida mandou: "cola tenaz" que é essa mania que a gente tem de usar a marca canonizada, consagrada ao invés do nome da coisa, o substantivo. Que nem 'danone': coisa restrita quando era criança. Só passou a consumir mais disso depois que virou yogurte. Ela é uma só, dentro e no meio de um mundaréu de gente. Depois que a ação humana explorou o yogurte cuspiu a bebida láctea. Só. Bebida pra alimentar gente em bando com menos vacas e funcionários, mas mais rendimento. Bom, ele entendeu. Disse: tem bastão e líquida. Qual você prefere? Mas não a deixou responder: a líquida, neh? É melhor, completou. Ela ficou na dúvida. Pensou nos papéis. Eram papéis delicados. Trampo besta. Acha que é antropóloga de plantão, mas faz as vezes de burrocrata. Ela e os outros antropológos, o mundaréu antropo-logicamente contemporâneo. Trampo chato. Precisa prestar contas. Precisa ué, tem que colar papéis em folhas A4 numeradas. Tem. Então faz. Ela decidiu. Ele queria vender um bastão imenso, dizendo ser bom e barato. Mas ela ainda fica admirando a si mesma quando consegue perceber o que de fato precisa. Não precisava de um tubo de cola bastão imenso. Precisava só colar os papéis do presente. Guardar cola pro futuro pra quê?
Ele disse algo sobre o passado. Falou de máquinas de escrever. "Mas não é do seu tempo". É sim! É? Tenho uma 'olivetti'. Mas ela pensava nos papéis e no que ainda tinha que fazer na rua. A Lapa de São Paulo é diferente da carioca, mas tem muita coisa pra fazer. Mas não adiantava: ela tem que voltar e colar papéis.
Atravessa a rua na faixa de pedestre.


                                                       Já do outro lado, um desconhecido diz: quer fazer rolo na bolsa? 
- Não, obrigada. 
     E não resiste: precisa olhar pra bolsa dele. Era maior. Até bonita. 
Mas a dela tinha história. A dela tinha a história que era dela. 
Não ia se apropriar assim da história do outro só por causa do rolo da mercadoria.
 Diante da recusa ele, dono da Lapa toda, em quase carioquês:
- A MINHA É MAIS BONITA!


Foto: Isabela Morais, menina da Clélia.
A quem dedico.

II

Caso pensado diverge de pensar o caso.

O primeiro é premeditado, consistente. Feito. Realizado. E, ainda que mal, realizado.
O segundo pode ser. É premeditação. E pode nunca ser. É potência, ao mesmo tempo, com e sem potencial. Mas é uma vontade de ser, de fazer, de ver feito. É vontade de ser caso pensado.
Daí que, caso muito tivesse pensado, muito pouco faria. Mas o inverso também cabe. E cabem outras intensidades como 'quanto mais pensa, mais e melhor faria'. 
Caso tivesse feito pouco, muito pouco pensaria. O que não é necessariamente verdade. Que também não é o mesmo que uma verdade necessária.
Tudo isso seria uma verdade exclusiva se pensar o caso também não fosse meditar sobre um caso que efetivamente aconteceu.

Assim sendo, caso pensado converge: pensar um caso é também ato.

Ter um blog é como ter um bichinho virtual. Uma quase brincadeira de criança, mas uma vez no ar,  precisa ser alimentado.
Pois bem.
Eu também tenho fome.




Ela fez, hoje, algo que nunca tinha feito.
Beijou a mãe. Assentou o banco do passageiro do amigo de infância do irmão, preto retinto.
Ele, irmão da amiga dela. Estudaram juntas n'alguma série dessas. Ele, o amigo do irmão, perguntou pra onde ela ia. Não sabia muito bem. Reaprendia a andar em São Paulo. Disse então aonde é que queria chegar. Ele ensinou que fosse à Guaianases - era isso que ela nunca tinha feito na vida, mesmo tendo morado na zona leste paulistana, que é imensa mesmo. Pegou um micro-ônibus ou foi pega por ele. Tudo teria sido um experimento antropológico se ela já não estivesse impedida de re-fazer a matrícula na pós-graduação. De toda forma, uma vez antropóloga, sempre! Por todo o caminho até a estação de trem percebeu toda aquela contestação civilizatória da paisagem. Toda, ou quase toda, a epistemologia da periferia é anti-burguesa. E a polícia, várias viaturas a prestes, a postos. 
Uma vez na estação, aquele mundo de gente. O amigo do irmão disse que era bem fácil. O trem expresso só pára em Itaquera e é mais rápido que o cata-loko cotidiano. No fim, achou bom. Pôde ver as obras do Itaquerão. Porra, como isso aqui cresceu! É bom sair da bolha. É bom fechar o ciclo. De repente, olhou pro lado: conseguiu sentar. Dezessete horas. Vagão lotado sentido Luz. Um menino de moicano joga qualquer coisa no PSP (coisa que ela nunca tinha visto na vida também) achou que era futebol, desses que passa nas Tvs ligadas na periferia de Brasil e Uruguai. Estava no Tatuapé. Na sua frente um anúncio de chicken M'c Bits dizendo "compartilhe se for capaz". O trem segue, tem horas que ele parece metrô, esse expresso que sai de Guaianases. Na frente dela, um menino, anel de compromisso no dedo, alargadores nas orelhas e os outros dedos manejantes no aparelho que é condição de sobrevivência no transporte público: um celular que toca música. O menino do PSP desceu em qual estação? Agora o menino tem outro moicano, mas mais discreto. Bem mais. E os auscultadores, tampam os ouvidos mas não a mente. Escureceu. Que horas são? Lembrou-se do Itaquerão e desejou que a torcida corintiana lotasse a geral inacabada. É também por isso que se lotam as ruas. Porra, como Itaquera cresceu (escreveu 'venceu' por ato falho, mas também por convicção). Odebrecht sinalizando a placa entre os símbolos do curintha. Não é corinthiana nem fodendo. Mas sonhou o Itaquerão lotado de ZL, preta retinta. 
O Danilo tinha razão. Dezessete e trinta. Em meia hora de Expresso, tava no Brás. 

Na Luz, quando baldeava pro metrô esbarrou com o menino do alargador. Ele não tinha descido, mas sentado. Lembrou da sua blusa: 'enjoy coca-cola'. A viagem não acabara, ela sabia.

sábado, 22 de junho de 2013

Neguinho que eu falo é nóis.


O que define a vida de neguinho?

O que importa a neguinho?

Neguinho é rei... (?)

Sei não, neguinho...



quarta-feira, 19 de junho de 2013

segunda-feira, 17 de junho de 2013



Tem gente que não sabe, ou não entende que, em termos históricos, destruir é tão importante quanto construir.

sábado, 15 de junho de 2013




A ideia de que historicamente o Brasil é país avesso a manifestações é, no mínimo, equivocada. E os processos de apagamento da história de luta dos pobres e descontentes em nossa sociedade é tão violento quanto o cassete que quer intimidar quem protesta.

sábado, 6 de abril de 2013


Conseguiu uma hora na manicure hoje. Era querer demais que fosse a Cris, sua preferida. Mas não importava, não via a hora de arrancar a pele morta, envernizar a queratina da ponta dos dedos. A profissional pergunta: pé ou mão? Eram os dois, mas ela chegara atrasada. Não tem celular, não tem relógio, está desorientada, não-situada.
Resignada, pensa que já não pode olhar mais para as mãos. A mão, responde. 
A TV diz que a seleção de futebol joga contra a Bolívia. Início de partida, ela se rende, fica: gosta da bola chutada como capacho. Repara mentalmente que a barba faz bem a Neymar. A mulher termina a cirurgia superficial e faz o curativo esmaltado na ponta dos seus dedos. Ela se sente melhor, mais leve e diz que vai ao banco pagar as contas que a esperavam ansiosas. Dirige. Passa na frente de um boteco e olha desatenta, mas nota o mesmo tiozinho que lhe dissera que "jardinava 'sua' árvore" plantada na frente da casa que nem era mais sua. 70 reais. Agora ele está cumprindo o turno da tarde noutro boteco, não mais naquele que fica na frente da casa que não é mais sua. 
Segue pensando nessas coisas enquanto ruma para o banco. Prometeu à manicure que voltava para curar os pés. 
Desce do carro. Um "tio" chapado declama 'pá arrumá uma moedinha pá nóis'. Ela balança a cabeça como quem não quer afirmar, mas sinaliza um tímido sim com o indicador. 
Sai do banco. Quase não lembrou da senha, mas tem memória de elefante. Fora do carro outro tio chapado espera, prostrado do lado da porta. Cinquenta centavos. Ele pede pra um deus abençoá-la por ter acabado de servir-lhe a próxima cachaça. Liga o rádio, bate a chave no contato. Elza Caetaneada viscera que o haiti é aqui, o haiti não é aqui. 
Volta para "fazer o pé". A manicure de ocasião lhe espera. A preferida sente pena por não ter agenda, para que na intimidade terapeutica do ofício apreenda um pouco de seus últimos meses. Ela também lamenta. 
Na TV, Galvão B. fala da 'festa da torcida do Brasil' que o canal inventou. 
E ela escreve imersa num escalda-pés. 
"É do Brasil": 3 a 0 e ela nem percebeu. 
A cabeleireira nota: tá estudando? Não! Tá fazendo uma redação? Sim! Tou fazendo uma redação! Nossa, que menina estudiosa, em pleno sábado! 

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

Mussum ressuscitado em propaganda.


Da série: notícias de jornal



Mussum em propaganda da VW


Não sou ligada em TV. Menos em propaganda. Mas vale pelo remake da SP do Viaduto do Chá (o Anhangabaú é lugar consagrado de protestos) e pelas "piadinhas" pra ajudar a situar o contexto. A música é groove e lembra a versão do Simonal, cantor e performer negro que ajudou a vender muito carro nos 70 e foi tachado de delator no contexto do regime. A relação entre musica popular, futebol (a seleção de 70 campeã do México ganhou fuscas de Paulo Maluf, prefeito de SP à época, pagos com dinheiro público, óbvio!) e a ditadura também figura na "baratinha" (como eram chamados os fuscas-carros pretos de polícia na época) que no comercial é outro clichê atualizado. Qualquer semelhança com o "Pra Frente Brasil" dos 70 e "Milagre Econômico" dos 80 com o Fusca 2013 e o milagre atual não será mera coincidência: elas não existem. No mundo do capital, além de estímulo ao consumo, propaganda também é memória. Em tempo: gosto de futebol, gosto do Cazé, de fusca, de Led Zeppelin, disco voador, rádio AM, do Mussum e do Simonal. Mas o comercial deve ter sido feito por gente que ultrapassada que acha que as mulheres não sabem nada de carro. Desconhecem o fato básico de que ninguém nessa vida pode saber de tudo.

Em tempo: Dirijo muito bem!