domingo, 30 de junho de 2013

Sociologia dos transportes públicos

Os paulistanos* acabam de fundar uma nova categoria sociológica.
Eixo rente à sociologia de boteco, eis que os últimos acontecimentos fundaram a sociologia dos transportes.
Pode ser um evento pontual, mas o fato é que se ouve à boca pequena, média e grande. A análise sensocomunal diz que não são só os vinte centavos, embora também o sejam. O descontentamento é grande, "em todos os setores" diziam. Um mais velho, quarenta, aproximadamente. O outro, nem trinta. Mas perto deles.
"Educação falida".
"Pensar, realizar um raciocínio lógico: não há estímulo para isto".
"Se o estudo escolar está reduzido ao decorar, só se faz reproduzir sem crítica aquilo que é repassado". "Um povo com sabedoria e saúde é pedra no sapato deles".
"Só não investem em saúde e educação porque são investimentos que trazem resultados a longo prazo. Não é o governo que está no poder que vai usufruir imediatamente, com votos. Mas sim o outro governante que entrar no lugar dele".

E ainda tem gente que diz que o senso comum não está suficientemente politizado. Até parece que só os acadêmicos têm leitura própria da realidade que os cercam.
De todo modo, acadêmic@s ou não, podem dizer: eu presto mesmo muita atenção nos homens.

* ou quaisquer moradores das grandes cidades do país e que passam sufoco nos transportes públicos.

sábado, 29 de junho de 2013

Cada um tem a marcha que precisa

Tem descompasso.
Tem gente que marcha por educação.
Tem gente que marcha por saúde.
Tem gente que marcha sem terra.
Tem gente que marcha por direitos.
Tem gente que marcha por conquistas.
Tem gente que marcha-soldado e vai preso pro quartel.
Tem gente que não tem nem vinte centavos de marcha.
Tem gente que ataca quem marcha.
Tem gente que ataca quem ataca.
E tem gente que marcha para Jesus.

sexta-feira, 28 de junho de 2013

O título vem depois

Andou viajando, na vida, ultimamente.
Viajando na vida andava sempre. Mesmo que estivesse parada. A cabeça sempre foi de menina que não parou em lugar algum. Imaginação é o primeiro instrumento que tinha para ser livre.
Mas andou viajando pra além do imaginário. Este anda com ela pra onde ela for, ainda que fique quieta.  E sobretudo por isso. Mas andou a viajar diria, mais precisamente.
Nesse viajamento, houve momentos em que ela achou que a viagem estava acabada quando apenas tinha acontecido uma pausa. Dessas que também podem ser musicais.
Quando a viagem retomou a si própria, ela disse que não tinha nada a ver com aquilo. Mas sempre soube, ainda que se enganasse sobre o fim da viagem - porque tem uma intuição muito intuitiva, essa menina - que era só o começo. Pois então...
Isso tem a ver com o momento da vida. Não tem casa estabelecida. Um dia está na casa da mãe e do irmão. Outro dia na casa das amigas lá do outro lado do oceano. Outro dia na casa da outra amiga em São Paulo, no outro dia na casa do amigo-irmão e d@s vári@s amig@s que fez no sertão da pauliceia quando fez uma pausa de treze compassos. Enfim. Trânsito. Desses que colocam os carros um atrás do outro nas ruas, mas também do outro, aquele que faz com que você não consiga desfazer a mala. É isso, pousos de libélula.
Demorou pra entender o que era isso. Era tudo e não era nada. Ficou treze anos parada em um lugar, que era novo, antes. Depois ficou velho. O lugar, tudo. Ela inclusive. Treze compassos, dez dezenas e três unidades contidas em dois milênios ocidentais. Acostumou-se com aquela felicidade e com as tristezas guardadas no tempo-espaço do mesmo compasso. Precisava ser triste e feliz em outro lugar, soltar outras notas, cantar em outras afinações, ver filmes com intervalos e criar novos filmes na memória. E ela, que vê como sua a responsabilidade de inventar a própria vida, inventou outros lugares na cabeça e fora dela. E os lugares também inventaram-na que ninguém é imune a nada.
Mas este não é um escrevinhar sobre movimentos da vida, que ela ainda não sabe pra onde vai, mas tem ido. Era continuar a dizer sobre papéis. Ia dizer que era um escrever sobre papéis, de novo. Mas olhou pras linhas de trás e viu que era isso e mais outras coisas. Os compassos. Os movimentos. 
Toda vez que viaja compra papéis: pros amigos mais amados. Oferece coisas ridículas, árvores rasgáveis. Um dia, se lhe odiarem, rasgar-lhe-ão todos os presentes. Quando percebeu que comprava muitos papéis de presente pra si própria e para @s querid@s, passou a comprar lápis. O que será que isso quer dizer? Ou não quer dizer? Ou quer dizer e não diz? Ou diz e não quer dizer?
Lembrou-se de um tipo de papel comprado recentemente para si. Alice através do espelho. Abandonou a viagem da Alice na outra margem do rio oceano, tinha de prosseguir (n)a sua própria viagem.
Quando a viagem já tinha assentado nela, assentou num banco de passageiro para o retorno. Como num acaso interessado, deparou-se com um filme que há muito queria ver. 
Achou que, como as músicas que tem na vitrola da cabeça, aquele era um filme que encerrava bem aquela etapa da viagem. Um filme pode ser bom por si mesmo, mas as vezes não é por isso: é porque você esteve envolvido nele. Esteve no filme, com ele. Esse filme, desse caso, é composto por coisas tão absurdas, quanto os absurdos que ela tinha na cabeça e na memória. Enquanto via, dizia que não era possível, chegava a ser altamente contestável.  Era um clichê aquilo, porque enquanto o via, pensava e não conseguia esquecer que estava diante de um filme. Contestava o filme. Dizia que não tinha nada com aquilo, como não tinha nada a ver com a viagem. O trailer não mostra nada - acho que é daqueles trailers que não consegue dizer o que o filme é. Assim como o caminho da viagem. Tantos caminhos cabem nele que se faltar um, não se pode dizer o que a viagem é. O trailer e o caminho não mostram nada, mas devem mostrar alguma coisa. 



No fim, a viagem é sempre pra dentro.


quinta-feira, 27 de junho de 2013

Dias de Clélia

Precisava só de cola.
Dessas que colam papéis. Adora papéis com acento. Não consegue pensar em papeis. Mas essa nova gramática serve para imaginá-los em branco. Acentuados são, necessariamente: escritos, desenhados, numerados, rasurados, cheios, usados, amassados, rasgados até. É que nem aquela coisa de Geo-grafia: sem ação humana devia ser espaço expressado, escrivinhado ou imaginado diferente daquelas vezes em que o bicho-homem pôs as patinhas.
Era disso que precisava, uma pasta colante. Achou a papelaria.
A Lapa de São Paulo não é a mesma do Rio, mas bem que podia ser...
Bom, não era. O balconista, um senhor, bem senhor, mas bem simpático. Ela disse que precisava de cola. Dessas de colar papéis. Em seguida mandou: "cola tenaz" que é essa mania que a gente tem de usar a marca canonizada, consagrada ao invés do nome da coisa, o substantivo. Que nem 'danone': coisa restrita quando era criança. Só passou a consumir mais disso depois que virou yogurte. Ela é uma só, dentro e no meio de um mundaréu de gente. Depois que a ação humana explorou o yogurte cuspiu a bebida láctea. Só. Bebida pra alimentar gente em bando com menos vacas e funcionários, mas mais rendimento. Bom, ele entendeu. Disse: tem bastão e líquida. Qual você prefere? Mas não a deixou responder: a líquida, neh? É melhor, completou. Ela ficou na dúvida. Pensou nos papéis. Eram papéis delicados. Trampo besta. Acha que é antropóloga de plantão, mas faz as vezes de burrocrata. Ela e os outros antropológos, o mundaréu antropo-logicamente contemporâneo. Trampo chato. Precisa prestar contas. Precisa ué, tem que colar papéis em folhas A4 numeradas. Tem. Então faz. Ela decidiu. Ele queria vender um bastão imenso, dizendo ser bom e barato. Mas ela ainda fica admirando a si mesma quando consegue perceber o que de fato precisa. Não precisava de um tubo de cola bastão imenso. Precisava só colar os papéis do presente. Guardar cola pro futuro pra quê?
Ele disse algo sobre o passado. Falou de máquinas de escrever. "Mas não é do seu tempo". É sim! É? Tenho uma 'olivetti'. Mas ela pensava nos papéis e no que ainda tinha que fazer na rua. A Lapa de São Paulo é diferente da carioca, mas tem muita coisa pra fazer. Mas não adiantava: ela tem que voltar e colar papéis.
Atravessa a rua na faixa de pedestre.


                                                       Já do outro lado, um desconhecido diz: quer fazer rolo na bolsa? 
- Não, obrigada. 
     E não resiste: precisa olhar pra bolsa dele. Era maior. Até bonita. 
Mas a dela tinha história. A dela tinha a história que era dela. 
Não ia se apropriar assim da história do outro só por causa do rolo da mercadoria.
 Diante da recusa ele, dono da Lapa toda, em quase carioquês:
- A MINHA É MAIS BONITA!


Foto: Isabela Morais, menina da Clélia.
A quem dedico.

II

Caso pensado diverge de pensar o caso.

O primeiro é premeditado, consistente. Feito. Realizado. E, ainda que mal, realizado.
O segundo pode ser. É premeditação. E pode nunca ser. É potência, ao mesmo tempo, com e sem potencial. Mas é uma vontade de ser, de fazer, de ver feito. É vontade de ser caso pensado.
Daí que, caso muito tivesse pensado, muito pouco faria. Mas o inverso também cabe. E cabem outras intensidades como 'quanto mais pensa, mais e melhor faria'. 
Caso tivesse feito pouco, muito pouco pensaria. O que não é necessariamente verdade. Que também não é o mesmo que uma verdade necessária.
Tudo isso seria uma verdade exclusiva se pensar o caso também não fosse meditar sobre um caso que efetivamente aconteceu.

Assim sendo, caso pensado converge: pensar um caso é também ato.

Ter um blog é como ter um bichinho virtual. Uma quase brincadeira de criança, mas uma vez no ar,  precisa ser alimentado.
Pois bem.
Eu também tenho fome.




Ela fez, hoje, algo que nunca tinha feito.
Beijou a mãe. Assentou o banco do passageiro do amigo de infância do irmão, preto retinto.
Ele, irmão da amiga dela. Estudaram juntas n'alguma série dessas. Ele, o amigo do irmão, perguntou pra onde ela ia. Não sabia muito bem. Reaprendia a andar em São Paulo. Disse então aonde é que queria chegar. Ele ensinou que fosse à Guaianases - era isso que ela nunca tinha feito na vida, mesmo tendo morado na zona leste paulistana, que é imensa mesmo. Pegou um micro-ônibus ou foi pega por ele. Tudo teria sido um experimento antropológico se ela já não estivesse impedida de re-fazer a matrícula na pós-graduação. De toda forma, uma vez antropóloga, sempre! Por todo o caminho até a estação de trem percebeu toda aquela contestação civilizatória da paisagem. Toda, ou quase toda, a epistemologia da periferia é anti-burguesa. E a polícia, várias viaturas a prestes, a postos. 
Uma vez na estação, aquele mundo de gente. O amigo do irmão disse que era bem fácil. O trem expresso só pára em Itaquera e é mais rápido que o cata-loko cotidiano. No fim, achou bom. Pôde ver as obras do Itaquerão. Porra, como isso aqui cresceu! É bom sair da bolha. É bom fechar o ciclo. De repente, olhou pro lado: conseguiu sentar. Dezessete horas. Vagão lotado sentido Luz. Um menino de moicano joga qualquer coisa no PSP (coisa que ela nunca tinha visto na vida também) achou que era futebol, desses que passa nas Tvs ligadas na periferia de Brasil e Uruguai. Estava no Tatuapé. Na sua frente um anúncio de chicken M'c Bits dizendo "compartilhe se for capaz". O trem segue, tem horas que ele parece metrô, esse expresso que sai de Guaianases. Na frente dela, um menino, anel de compromisso no dedo, alargadores nas orelhas e os outros dedos manejantes no aparelho que é condição de sobrevivência no transporte público: um celular que toca música. O menino do PSP desceu em qual estação? Agora o menino tem outro moicano, mas mais discreto. Bem mais. E os auscultadores, tampam os ouvidos mas não a mente. Escureceu. Que horas são? Lembrou-se do Itaquerão e desejou que a torcida corintiana lotasse a geral inacabada. É também por isso que se lotam as ruas. Porra, como Itaquera cresceu (escreveu 'venceu' por ato falho, mas também por convicção). Odebrecht sinalizando a placa entre os símbolos do curintha. Não é corinthiana nem fodendo. Mas sonhou o Itaquerão lotado de ZL, preta retinta. 
O Danilo tinha razão. Dezessete e trinta. Em meia hora de Expresso, tava no Brás. 

Na Luz, quando baldeava pro metrô esbarrou com o menino do alargador. Ele não tinha descido, mas sentado. Lembrou da sua blusa: 'enjoy coca-cola'. A viagem não acabara, ela sabia.

sábado, 22 de junho de 2013

Neguinho que eu falo é nóis.


O que define a vida de neguinho?

O que importa a neguinho?

Neguinho é rei... (?)

Sei não, neguinho...



quarta-feira, 19 de junho de 2013

segunda-feira, 17 de junho de 2013



Tem gente que não sabe, ou não entende que, em termos históricos, destruir é tão importante quanto construir.

sábado, 15 de junho de 2013




A ideia de que historicamente o Brasil é país avesso a manifestações é, no mínimo, equivocada. E os processos de apagamento da história de luta dos pobres e descontentes em nossa sociedade é tão violento quanto o cassete que quer intimidar quem protesta.